quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Meu Medo

     Homem negro e pobre. Meu perfil. Não me define, não contempla todas as complexidades da minha existência e, sendo assim, não destaca tudo que de fato eu sou. Mas, é o meu ‘’perfil’’, pois além de ser filho, irmão, esposo, amigo, cristão, estudante universitário, músico letrista, poeta, trabalhador, entre outros, eu sou um homem negro e de baixo poder aquisitivo. E essas duas coisas que não me definem interferem em todos os aspectos da minha vida.
     Ser pobre limita os lugares aonde eu vou e as oportunidades às quais eu tenho acesso, como viagens, cursos, obras literárias e espetáculos. Ser negro influencia na forma como eu sou visto por terceiros. De forma especial quando estou em um lugar que normalmente não é frequentado por pessoas de baixo poder aquisitivo, que - no Brasil - são majoritariamente negras. Além disso, ser negro me garante escolta especial quando estou em lojas de departamentos e mercados, exclusividade no uso de calçadas durante as noites no centro (já que costumam atravessar quando me aproximo) e mais espaço ao atravessar em semáforos, onde senhoras apertam suas bolsas contra o corpo para me garantir maior mobilidade, provavelmente.
     Ser pobre, entretanto, não me priva de ser contemplado por esse tradicional costume da cultura carioca chamado assalto. Aliás, ser pobre me leva a usar transporte público ou andar a pé, o que me deixa mais propenso a ter meus pertences tomados sob ameaças de morte de um personagem folclórico conhecido como “dois caras em uma moto”. Ser pobre me leva a morar em um bairro periférico o que, conjugado com a cor da minha pele, leva pessoas a acreditarem que EU sou um dos caras na moto.
     Ser visto como um possível praticante de assaltos me torna um alvo em potencial de violência policial, uma vez que na periferia eles parecem ter carta branca para agirem com a truculência que acharem necessária, e eles sempre acham necessária. Se bem que alguns traficantes que ganham carona no “Caveirão”, recebem armas de uso restrito e carregamentos de munição podem discordar.  Para mim, que não estou em dia com o pagamento do carnê do arrego, resta o risco de estar no lugar errado, na hora errada e acabar sendo preso por um crime que não cometi.
     Recapitulando, até o final de 2018 eu já era um homem negro que mora na periferia, é seguido nos mercados, olhado com estranheza/suspeita em locais da cidade e uma possível vítima de violência policial e crimes forjados. Isso ignorando todas as outras implicações psicológicas da visão sobre o negro nesse país como o desmerecimento da beleza, inteligência, cultura e relevância histórica.
     Se esta lista de adversidades para o bom andamento de uma vida plácida já não fosse suficiente, agora eu preciso me preocupar com a possibilidade daquelas pessoas que me olham esquisito e apertam as bolsas contra o peito ao me verem passar estarem armadas. O que é uma mudança significativa já que, ao invés de atravessarem a rua, eles(as) podem sacar de uma pistola na minha direção. Uma simples corrida para alcançar o ônibus pode resultar no meu último suspiro e andar com guarda-chuva na mão significará praticamente implorar pra levar um tiro. Afinal, mesmo policiais treinados os confundem com fuzis, como uma dona de casa saberia a diferença?
     A vida do homem negro e pobre corre risco. Todos os riscos que o homem branco e pobre corre, com alguns acréscimos. Afinal, a regra do “Inocente até que se prove o contrário” não se aplica a nós. Na verdade, cabe a nós provar nossa inocência a cada instante a fim de preservar nossas vidas.
     O homem negro e pobre corre risco! Risco de ser visto como um risco e por isso ser riscado do mapa. Risco de ser eliminado sem chance a defesa. Risco de ser ofendido e humilhado, mesmo tendo antecedentes imaculados. O homem negro corre risco, e essa é a minha humilde opinião, baseada na minha experiência de 28 anos sendo um negro pobre no Brasil.

Ass: Bruno Santos

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