domingo, 9 de julho de 2017

"Invadindo" a Praia

     No ano de 1985 a Banda de Rock Ultraje à Rigor lançava seu LP de estréia. A Seguir veremos um trecho da música "Nós Vamos Invadir Sua Praia" que da nome ao disco:

"Daqui do morro dá pra ver tão legal
O que acontece aí no seu litoral
Nós gostamos de tudo, nós queremos é mais
Do alto da cidade até a beira do cais
Mais do que um bom bronzeado
Nós queremos estar do seu lado"

     Apesar do produtor da banda ter dito na época do lançamento que a música fazia referência à invasão da banda paulista em terreno carioca, é possível fazer outra leitura da mesma. Veja bem, no Rio de Janeiro, favelas como a da Rocinha e Vidigal possuem visão privilegiada das praias, de lá é possível vê-las com uma facilidade que pode não existir para os moradores da baixada.

     Entretanto, a facilidade de ver a praia não é sinônimo de uma chegada fácil na mesma. E essa dificuldade vai além da deficiência do transporte público ou dos altos preços da condução. Para alguém que more no Leblom ou em Ipanema, caminhar pela orla da praia nas primeiras horas da manhã durante o verão é uma atividade quase banal, tão natural quanto a compra do pão para o café da manhã. Mas, as regras mudam se você for de fora, pois para estes existem "pré-requisitos" como estar de camisa e portar documento de identidade.

     Dicotomia que foi evidenciada nos recentes casos de jovens moradores de periferias (majoritariamente negros) que foram detidos e encaminhados à delegacias da região enquanto estavam a caminho da praia, sendo tratados como criminosos em potencial que ofereciam risco para a comunidade.

     Apesar de não chegar ao ponto de envolver a polícia, essa diferenciação entre moradores e não-moradores ocorre também nas praias de Niterói, temos como caso mais explicito a situação de Itaquatiara, praia que é considerada área nobre da cidade e é amplamente frequentada por moradores de São Gonçalo. Já foram divulgados nas redes sociais casos de ataques de tubarão e até avistamento de onças pintadas com o objetivo de afastar os "forasteiros" que segundo relatos dos moradores "fazem sugeria, ouvem funk bem alto, falam palavras de baixo calão, mijam nas portas das casas, estacionam em vagas para deficientes e se comportam como selvagens".

     Essa óbvia generalização é potencializada por esteriótipos advindos de bairrismos (disputas entre bairros), mas não podemos descartar dessa relação a discriminação por cor e classe social. Afinal, um gonçalense não tem uma tatuagem na testa que o identifique, e qualquer um dos atos citados acima poderia ter sido praticado por um morador de qualquer outro lugar, inclusive por um turista estrangeiro. Ligá-los a quem não mora na região é tão somente um mecanismo de defesa que visa desmerecer o diferente, afastá-lo da área que a pouco era uma zona de conforto.

     O problema é que essa área de conforto em especial - a praia - se encaixa na categoria dos "bens de uso comum do povo". Se encaixam nessa categoria todos os bens inapropriáveis e inalienáveis, existentes no território do país, cuja utilização não pode ser restringida de forma alguma, sendo passível de uso por qualquer pessoa do povo. 

     Impedir cidadãos desse país tropical de frequentarem as praias é tão ilegal que chega a ser imoral.  Todos temos direito a desfrutar do espaço que é denominado público, seja em uma tarde na praia, um rolezinho na Praça da Bandeira ou uma manifestação nas Laranjeiras, desde que saibamos preservar esse espaço que também é nosso, pois mais do que um bom bronzeado, nós queremos estar em posição de igualdade social, mas essa é apenas a Minha Humilde Opinião.

Ass; Bruno Santos


Fontes:

Ultraje a Rigor, Nós Vamos Invadir Sua Praia, WEA, 1985.

https://territoriogoncalense.blogspot.com.br/2016/11/a-intolerancia-asquerosa-na-praia-de.html?m=1

https://jus.com.br/artigos/11417/o-regime-juridico-das-praias-marinhas

https://www.google.com.br/amp/s/extra.globo.com/noticias/rio/pm-aborda-onibus-recolhe-adolescentes-caminho-das-praias-da-zona-sul-do-rio-17279753.html%3Fversao%3Damp

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