sábado, 18 de junho de 2016

Com que touca eu vou?

     O frio pegou a nós, cariocas, de jeito! Mudou nossos hábitos e virou o assunto mais comentado. Com a chegada dele a procura por repelentes nas farmácias deu lugar a uma busca enlouquecida por manteiga de cacau, a melhor amiga dos lábios ressecados pelo frio.
     Caminhando numa dessas noites geladas, indo de drogaria em drogaria a procura de minha amostra (fui em sete no total), passei por uma cena curiosa: uma senhora que pedalava tranquilamente pela via, vestia um par de tênis confortáveis, uma calça de ginástica, um casaco quentinho e uma touca ninja. Sim, uma touca ninja!
     Sendo eu um ciclista, me admirei com a genialidade daquele ato. Ao contrário de outros ciclistas que eu já tinha visto naquela noite (é incrível a forma como coisas que te interessam parecem saltar sobre você na rua), que lutavam para manter o capuz do casaco na cabeça contra o vento, aquela senhora estava a vontade.
     Suas orelhas estavam quentinhas, seu cabelo não estava bagunçado e ela respirava sem dificuldades. Mas, se aquele acessório foi feito sob medida para esse uso, por que nunca tinha visto aquela cena? Quem sabe, talvez, por que dificilmente um rapaz conseguiria pedalar por cem metros sem - na melhor das hipóteses - ser parado pela polícia?
     Bem, digo que quando me imaginei com aquele acessório pelas ruas do meu bairro a imagem que me veio foi a da touca sendo perfurada por uma bala de fuzil. Ainda na minha cabeça. E digo mais, acredito que se durante uma revista encontrassem ela em minha mochila, mesmo que ainda embalada, eu acabaria respondendo por todos os crimes realizados com toca ninja nos últimos anos.
     Não posso usar essa touca pelo mesmo motivo que a cor vermelha consta com uma ressalva no meu armário, pelo mesmo motivo que tive de parar de usar boné e pelo mesmo motivo que levou minha mãe a me proibir de usar certas marcas de roupa no passado. Medo! Medo de parecer algo, medo de chamar certo tipo de atenção, medo de ser notado até.
     Me vestir como os outros jovens (boné, bermudão, cordões) me faria ser parado pela polícia, andar arrumado demais me faria ser alvo para assaltantes, ou seja, a técnica para sobreviver à minha adolescência (segundo minha mãe) consistia em não ser notado. Obviamente todo jovem quer ser notado, então eu saía de casa o mais simples possível e acabava de me arrumar no ônibus, mas ainda sim aquele medo ficou para sempre no meu subconsciente.
     Hoje, é impossível para mim comprar uma roupa sem pensar que tipo de atenção vou atrair com ela, que tipo de pessoa vou parecer. É a mesma coisa que penso quando decido que é hora de cortar o cabelo ou fazer a barba. Não sou eu quem escolho minhas roupas, mas a sociedade que me cerca e a forma como eu acho que eles vão reagir a isso. Hoje por exemplo, eu gostaria de viver em uma sociedade onde fosse bem visto ir trabalhar enrolado em duas camadas de edredons.
     Existe um tipo de acordo velado, com roupas que são adequadas ou não, ninguém realmente fala sobre isso, as pessoas simplesmente sabem, algumas pelo menos. Quer dizer, quando você está no shopping e vê um cidadão entrando no cinema de chinelo e meia você sente um desequilíbrio na força, mesmo sabendo que não tem nada com a vida do indivíduo. Aquilo te faz sentir um desconforto.
     Senti isso uma vez ao ver um camarada na praia de terno e gravata, a sensação de que aquela pessoa deveria estar em outro lugar, ou no mínimo com outra roupa. Por isso, imagino que outras pessoas devam sentir isso em algumas situações, mas gostaria que esse "acordo social" fosse mais abrangente, que ele, por exemplo, permitisse que minha namorada me desse um casaco vermelho sem medo que isso me matasse.
     Não poderei usar touca ninja para andar de bike, não entrarei na minha comunidade de casaco vermelho e nem usarei roupas de marca para ir a lugares que conheço pouco, por medo da polícia (mesmo sem nunca ter cometido um crime), por medo da facção rival (mesmo sem pertencer a nenhuma) e por medo dos assaltantes (mesmo que eu seja apenas um pobre lascado). Viverei com medo, medindo minhas atitudes em virtude daquilo que os outros podem ou não pensar de mim.
     Nessas horas, eu queria que meus problemas se resumissem a precisar decidir se vou no cinema de chinelo e meia ou de pijama e achar que ISSO é viver perigosamente. Mas, essa é apenas a Minha Humilde Opinião.

Ass: Bruno Santos

sexta-feira, 10 de junho de 2016

X-Woman

   Nos últimos dias, um outdoor do mais recente filme dos X-Men tem sido criticado por pessoas que alegam que ele traz uma mensagem de superioridade masculina e incentivo a violência contra a mulher.
    Na qualidade de admirador do trabalho da Marvel, no que diz respeito a seus quadrinhos, desenhos e filmes, gostaria de mostrar que obviamente essa, em momento algum, foi a intenção.
   Nasci nos anos noventa, tive acesso a diversas HQ's, como pode ser visto na imagem que é da minha coleção pessoal, e vi o Professor Xavier (um cadeirante) ser subjugado tantas vezes quanto a Vampira ou o Wolverine. Isso se chama protagonismo.
    Significa que aquele personagem terá importância naquele episódio em particular, o que valoriza um momento de tensão. Reclamar de protagonismo feminino é quase incoerente. Essa claramente é uma história fantasiosa baseada em princípios maniqueístas em que o mal parece mais forte, mas mesmo assim é desafiado.
    Não vi o filme ainda e não quero ser acusado de dar spoiler, mas conhecendo X-Men como eu conheço, sei que haverá algum tipo de reviravolta com uma superação de limitações e alcance de objetivo através do poder da amizade ou algo do tipo. Se for verdade, me digam depois, mas sem spoilers!
  Os quadrinhos desses mutantes são fantásticos, eu consigo enchergar neles as lutas de todas as minorias para se encaixarem na sociedade, não apenas por serem mutantes, mas por serem negros, judeus, cadeirantes, gays, etc. Se a intenção fosse sugerir que a  Mística é inferior a outro personagem por causa do sexo ela seria apenas excluída da luta, ficaria de lado enquanto os homens lutam. Mas dizer que um quadrinho que tem a Ororo, Jean Gray e Psylocke, mulheres que lutam de igual para igual com qualquer homem é machista, é como dizer que Senhora de José de Alencar é um livro machista.
    Encerrando minha defesa dessa indústria capitalista que já me deu bastante gasto, mas que está intrinsecamente ligada a minha forma de ver o mundo e respeitar as pessoas, vou dizer que tudo parece algo fora do contexto, mas que é preciso um olhar além. 
    Acredito que teria um impacto negativo bem maior um banner mostrando a Mística (mocinha) arrancando a coluna vertebral do corpo inerte do Apocalipse (vilão) com aquele sorriso no rosto que os fãs sabem que a VERDADEIRA mística daria nos quadrinhos. Mas, essa é apenas a Minha Humilde Opinião.

Ass: Bruno Santos

sábado, 4 de junho de 2016

Bom dia, boa tarde e boa noite.

  E sou um cara um tanto quanto introspectivo, tenho poucos amigos e muita dificuldade para fazer novos, principalmente em curtos espaços de tempo. Mas, um dos ensinamentos de minha mãe, Dona Lenira, eu trago comigo quase como um mandamento. Ela me dizia na infância:

"Você não precisa ser amigo de todo mundo, mas você precisa mostrar para as pessoas que você é de lá."

    Talvez isso não faça tanto sentido para você caso não tenha crescido em uma comunidade, mas, em alguns casos, ser identificado como pertencente a um lugar pode salvar a sua vida.
    Sempre fui um garoto caseiro, saia pela manhã para a escola, voltava a tarde e só saia de casa novamente se fosse para ir na igreja durante a noite. Muitas pessoas que moravam na mesma rua que eu nem sequer sabiam da minha existência.
    Nesse contexto o "Bom dia, boa tarde e boa noite" se tornaram muito mais que cumprimentos, eram um cartão de embarque. Sei que em outras partes do Brasil é diferente, as pessoas se cumprimentam por educação, mesmo sem nunca terem se visto.
    Mas, onde eu cresci, só se fala com quem se conhece, e ter um rosto familiar pode te livrar de problemas. Hoje, sendo um negro de 1,80m, sei que um "Boa noite" em uma rua escura também ajuda a baixar as guardas e dissipar a tensão no ar. Mesmo que não completamente.
    Muitos dos garotos que ainda jogavam bola na rua enquanto eu saia para a igreja continuam na mesma rua, mas agora com armas na mão e eu sei que sem aquele cumprimento de anos atrás eu seria um estranho para eles, consequentemente uma ameaça e possivelmente um alvo.
    Certas vezes me deparo com senhoras idosas que me sorriem e perguntam como vai minha família, não faço ideia de quem são a maior parte das vezes, mas tenho a tranquilidade para lhes sorrir e dizer que estão todos bem. Pois, sei que elas se lembraram de um cumprimento que lhes ofereci algum dia a anos atrás.
    Quando você deseja um bom dia a alguém está gravando uma impressão sua na mente da pessoa, mesmo que seja no subconsciente. Pode parecer bobo e até desnecessário dar bom dia a um desconhecido, mas de certa forma isso demarca um território.
    Afinal, você não fala com estranhos em lugares que você não conhece. Seu cumprimento te dá poder sobre o espaço, por mostrar que naquele lugar você se sente seguro.
    Sei que para mulheres a coisa é mais complicada, já que existem homens que não sabem a diferença entre educação e interesse, mas ainda assim, vale a pena um olhar nos olhos vez ou outra. Você pode não se lembrar, mas outros lembrarão de você.
     A política da boa vizinhança não nos impede de ser assaltados na esquina da nossa casa, não torna desnecessário o uso de cadeados ou trancas, mas nos dá a sensação de companhia quando tudo parece ameaçador, então não negue um sorriso a um vizinho nem deixe de lhe oferecer um cumprimento. Mas essa é apenas a Minga Humilde Opinião.

Ass: Bruno Santos.